quarta-feira, 14 de março de 2018

DAMA DA NOITE

Sempre chegava quando o dia estava clareando, embriagada, enlouquecida, mal ajambrada eu diria, ou na melhor definição, desmontada.
Começava pelos cabelos que tirava com cuidado para não precisar escovar novamente no outro dia, o que era impossível, teria de escová-los com toda certeza. 
As unhas eram a parte mais incômoda, detestava arrancá-las, o que sempre fazia com um misto de fúria e preguiça.
Deixava as sandálias jogadas de qualquer jeito, as pernas doíam, o corpo doía, nada doía mais do que seu espírito corrompido e dominado por todos os vícios.
Se odiava todos os dias, quando via a maquiagem borrada como um palhaço de mau gosto. Arrancava as roupas de qualquer jeito e se jogava na cama para fumar seu cigarro solitário.
Ela não era feliz quando estava sozinha, era preciso guardar os sorrisos para os clientes.
Ali no escuro, a única luz que podia ser vista era a brasa do cigarro se movendo como um vagalume, por vezes em rápidos movimentos, para depois ficar planando no ar sem inerte.
A fumaça se misturava com suas lágrimas por vezes, queimava seus olhos cheios de sombra azul, que ela não tinha ânimo para limpar. Depois cansada de sentir pena de si mesma, decidia que precisava ser um homem forte, amanhã seria um outro longo dia de trabalho. Melhor dormir agora Alberto dizia para si, jogava a bituca do cigarro no chão, puxava o cobertor desgastado, e tentava fugir para onde pudesse não sentir, odiava sentir.

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